O antropoceno e a urgência de pensar possibilidades não modernas para a análise de questões ambientais: a controvérsia da solução para a poluição dos oceanos por plásticos

Tese de doutorado

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Resumo

Antropoceno é um dos nomes que vêm sendo acionados para se pensar os modos possíveis de enfrentamento das condições de existência atuais. Aquecimento global, perda da biodiversidade, poluição atmosférica, acidificação dos oceanos, escassez de água potável, são bons exemplos de questões que batem à nossa porta e têm potência para colocar em risco o futuro da vida no planeta. Todavia, temos permanecido indiferentes a elas. O que explicaria essa nossa falta de afetação para com as questões ambientais? Segundo o filósofo Bruno Latour, a fonte do problema estaria no modo como temos interpretado o mundo. O grande entrave estaria no modelo moderno, que organiza a realidade em duas zonas ontológicas inteiramente distintas: Sociedade e Natureza. Com esta abordagem, de acordo com o autor, não temos condições de apreender e interpretar as questões ambientais, estaríamos apenas a proceder um “salto mortale” entre humano e não-humano, ignorando o “meio do caminho”, isto é, o que liga os seres uns aos outros: as práticas de tradução. Desenvolver uma pesquisa no campo da Educação de Ciências, neste sentido, parece necessário e produtivo. O objetivo desta tese é exemplificar um modo de retomar a tarefa de rastrear as associações entre humanos e não- humanos, em uma questão ambiental, sem recorrer às dicotomias modernas. Selecionei como temática a ser explorada a controvérsia da solução para a poluição dos oceanos por plásticos, uma temática bastante popular nos últimos anos e que tem circulado por inúmeras mídias, artigos científicos, campanhas de ONGs ambientalistas, assim como reuniões de nações (Fórum Econômico Mundial, Conferências da ONU). O método utilizado para proceder ao rastreamento foi a Cartografia de Controvérsias, um conjunto de estratégias que permite observar e descrever a complexidade das associações entre os diversos atores. O mapeamento revelou elementos heterogêneos como inovações tecnológicas (plásticos biodegradáveis, tecnologia de limpeza dos oceanos), alianças internacionais da indústria do plástico (Marine Litter Solutions), de ONGs ambientais (Break free from plastic) e de empresas multinacionais (The New Plastic Economy) e campanhas globais (Clean Seas). As associações que deram existência a essas redes envolveram humanos e não-humanos, ziguezagueando entre estes por meio de traduções/desvios que foram permitindo aos atores seguirem seus interesses. Pode-se dizer, neste sentido, que a Cartografia de Controvérsias mostrou ser um instrumento produtivo para realizar a desdramatização de uma questão ambiental, permitindo renunciar às categorias globais e dirigir o olhar para os momentos em que esta toma forma, ampliando suas formas de representação.