O assentamento rural coletivo Copavi: contradições e avanços no processo de territorialização camponesa
Fábio Luiz Zeneratti, Prof.ª Dr.ª Eliane Tomiasi Paulino
Data da defesa: 25/06/2012
As reflexões contidas neste trabalho se inserem no debate sobre a pertinência da reforma agrária no contexto da elevada concentração fundiária brasileira, tendo como recorte empírico a Cooperativa de Produção Agropecuária Vitória (COPAVI), uma experiência de assentamento rural fundada no trabalho coletivo sob uma modalidade de cooperativismo que alcançou êxito em poucas experiências, posto que a maioria dos assentados, ao alcançarem o acesso à terra, tendem a explorá-la individualmente. Longe de se ocupar da oposição que frequentemente é invocada para indagar qual é o melhor modelo de assentamento, o coletivo ou o individual, o que o trabalho procura evidenciar é que o modelo de desenvolvimento capitalista brasileiro possibilitou que a propriedade da terra se mantivesse sob controle de uma pequena parcela da população, com isso, a luta pela reforma agrária ganhou importância e representatividade. Os movimentos sociais foram os maiores responsáveis pela espacialização e territorialização da luta pela terra, a partir disso emergiram formas alternativas de produção nos assentamentos, elas estão possibilitando a concretização da reforma agrária, guardadas as especificidades do grupo organizado bem como a Geografia do local onde estão inseridos. No caso em questão, foi possível observar que o cooperativismo é um importante mecanismo para evitar que a renda da terra camponesa seja apropriada pelo capital, sobretudo possibilitando aos cooperados a inserção no mercado sem a intermediação do capital industrial ou comercial. Para isso contribui a estratégia da policultura, mediante a qual se produz uma parte dos gêneros necessários à sobrevivência das famílias, reduzindo-se a dependência externa. A divisão do trabalho no interior do assentamento revela uma lógica que lembra a organização empresarial, embora contraditoriamente esteja integrada à lógica de trabalho camponês. Se para os cooperados de origem camponesa a lógica de trabalho empresarial é fator limitante para sua permanência no assentamento, pois não permite florescer seu Habitus camponês, para os trabalhadores passíveis de serem associados à tradição proletária, o problema é justamente vislumbrar tarefas a cumprir para além do que a dimensão contratual de sua condição proletária pretérita significava, pois a dedicação e a doação para com o assentamento, muitas vezes aumentando a intensidade e o tempo de trabalho, se apresentam como fatores determinantes para a permanência na cooperativa. Sendo assim, a necessária ruptura parcial seja com a tradição camponesa, seja com a tradição proletária, tem influenciado na decisão de desistirem ou permanecerem. Isso explica, em parte, a significativa rotatividade das famílias: desde a fundação, cerca de 40 famílias já passaram pela cooperativa, restando apenas seis das 16 inicialmente assentadas. Portanto, a dinâmica interna da COPAVI se situa numa posição ambígua, com ingredientes da lógica empresarial de gestão e da lógica camponesa de produção, possibilitando a convergência de trabalhadores distintos segundo uma perspectiva de classe. Sendo assim, a COPAVI resiste ao longo do tempo como resultado destas contradições, que ora se apresentam como fatores desagregadores ao trabalho coletivo, ora se apresentam como estratégias de resistência e fortalecimento.
Indicação geográfica do contestado caboclo e cooperativa agroindustrial familiar “As quatro irmãs do contestado” : uma proposição de rompimento do subdesenvolvimento regional no contestado catarinense
Dean Gomes de Oliveira, Nilson Cesar Fraga
Data da defesa: 04/09/2020
A região do Contestado Catarinense, apesar de ter passado por uma guerra que derramou muito sangue caboclo, causando muito sofrimento e perdas humanas, demonstra, na atualidade, um ambiente regado pela resistência cultural, resiliência e esperança de um futuro de coexistência dos povos regionais. Nesse sentido, o presente trabalho propôs a criação de um selo de Indicação Geográfica Cabocla (IG Cabocla), tendo como produto principal o pinhão, pois essa semente, legitimamente brasileira advinda da Araucária, tornou-se uma companhia para o homem e a mulher sulista, especialmente de Santa Catarina, sendo a marca territorial da população do interior do estado. Seu sabor e seu valor nutricional se revelam como um traço marcante na identidade cultural do mundo caboclo, além de sua comercialização gerar uma fonte de renda para a população assolada pela pobreza e miséria, em razão da guerra e da falta de investimentos dos poderes públicos. Em relação ao objeto de análise, a área de localização da pesquisa envolve os municípios de Lebon Régis, Calmon, Matos Costa e Timbó Grande, pertencentes à Associação dos Municípios do Alto Vale do Rio do Peixe (AMARP); esses municípios apresentam as menores taxas de Índice de Desenvolvimento Municipal Sustentável (IDMS) do estado. O registro de IG é entregue aos produtos ou serviços que são característicos de seu local de origem, o que lhes atribui reputação, valor intrínseco e identidade própria, diferenciando-os em relação aos seus similares disponíveis no mercado, apresentando uma qualidade única em função de recursos naturais, como solo, vegetação, clima e saber fazer (know-how), além de serem regulamentados pela Lei de Propriedade Industrial (n° 9.279/96). A projeção do pinhão no mercado poderá fomentar a geração de emprego e renda com a fixação da população em seus territórios de origem, assim como preservar as matas remanescentes nesse território dominado pelo latifúndio, desde antes da Guerra do Contestado, fator que sempre afastou o povo caboclo do direito à terra. Diante disso, foi sugerido o cooperativismo para alavancar a IG Cabocla, tendo como ideia a atuação, primeiramente, no ramo de produção agropecuária e, posteriormente, a consolidação de uma cooperativa de Turismo e Lazer, ao se considerar as belezas naturais, culturais, os sítios histórico-geográficos da guerra e a população acolhedora desses municípios. O cooperativismo é a doutrina que preconiza a colaboração e a associação de pessoas ou grupos com os mesmos interesses, a fim de obter benefícios comuns em suas atividades econômicas, dando visibilidade àqueles que lutam para sobreviver no mundo capitalista. Para a região cultural cabocla do Contestado, sugeriu-se a criação de uma cooperativa agropecuária e agroecológica, denominando-a de Cooperativa Familiar “Quatro Irmãs do Contestado”, tendo como intuito, além de comercializar pinhões in natura, o seu processamento, isto é, transformando-os em sucos, licores, compotas, chás, tortas, massas de bolo, sorvetes, paçocas, além de outros produtos escolhidos pela população cooperada, dentro da disponibilidade de produtos regionais. Sendo assim, este estudo conseguiu evidenciar os caminhos para serem seguidos, demonstrando a sua real viabilidade na atual conjuntura econômica e social do Contestado Caboclo, assim como compreender a complexidade do subdesenvolvimento na região do Contestado, marcada pela falta de infraestrutura de transporte, saúde, cultura, esporte e emprego. Diante de tais aspectos é que se optou por trabalhar as categorias de análise de espaço e tempo na concepção científica do materialismo histórico dialético.