O DISCURSO DE ÓDIO COMO PATOLOGIA SOCIAL NA CONJUNTURA DEMOCRÁTICA CONTEMPORÂNEA
Dissertação de mestrado
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Nos últimos anos, tem aumentado, de modo considerável, as denúncias de discursos com conteúdo discriminatório, das práticas públicas de preconceito, da hostilidade contra minorias sociais e das manifestações de extremismo e de polarização na sociedade. Na trilha da filosofia social, o presente trabalho tem por objetivo averiguar se as práticas discursivas de ódio e de preconceito, no atual contexto democrático, podem ser qualificadas como uma patologia social ou se seriam, no máximo, fatos fragmentados e episódicos que geram tensões do ponto de vista puramente moral e jurídico. Para tanto, propõe-se a elaboração de um diagnóstico desse possível distúrbio social com a identificação das particularidades das práticas discursivas de hostilidade que, em conjunto e sob a luz do paradigma honnethiano do reconhecimento, constituem uma práxis social degenerada prejudicial à realização mínima dos projetos de vida dos cidadãos. Assim, propõe-se especificar, por exemplo, os efeitos nocivos da naturalização desse comportamento pela sociedade, as causas eventuais de tais práticas sociais, as formas de reprodução e os mecanismos favoráveis à sua disseminação acrítica. Portanto, são apresentados os elementos constitutivos dessa patologia social e os mecanismos intersubjetivos de dominação, exclusão, desigualdade e opressão reproduzidos em conjunturas democráticas distorcidas. Com base na clara identificação desse quadro patológico, propõe-se um esboço de diretrizes para uma teoria antidiscriminatória da democracia, ou seja, examinam-se potenciais recomendações de cunho terapêutico em favor da transformação social e do combate do preconceito. Em termos metodológicos, a investigação é baseada, sobretudo, na teoria do reconhecimento de Axel Honneth e em suas explicações relativas às práticas de desrespeito e às disfunções sociais das sociedades contemporâneas. Para o aprofundamento do estudo, confronta-se a filosofia de Honneth com argumentos de seus críticos e de potenciais interlocutores, como Joel Whitebook, Nancy Fraser, Martha Nussbaum e Miranda Fricker. Ao longo do texto, distancia-se progressivamente da leitura política ideal e são apresentadas as incongruências reproduzidas pelas práticas sociais patológicas, bem como sua capacidade para impedir a satisfatória realização dos projetos de “vida boa” dos cidadãos e de grupos socialmente vulneráveis. De início, os principais argumentos de Jeremy Waldron, relativos aos discursos de ódio, são expostos para contextualizar a problemática e auxiliar o leitor na compreensão do debate existente na filosofia política. Em seguinte, é apresentada a estrutura elementar do paradigma do reconhecimento de Honneth e a proposta de diagnóstico crítico da filosofia social. Nos capítulos subsequentes, examinam-se os danos sociais dos discursos de conteúdo discriminatório, as lesões geradas às vítimas, as prováveis causas desses padrões comportamentais deletérios ao organismo social e os fatores de seu alastramento. Adicionalmente, expõe-se a concepção de democracia cooperativa e o exercício das liberdades à filosofia de Honneth. Por fim, são avaliadas as alternativas terapêuticas para a efetivação de uma conjuntura antidiscriminatória da democracia. Na conclusão, sugere-se o uso do diagnóstico para a formulação de uma concepção de democracia capaz de estimular um amadurecimento social favorável à autorrealização de todos os cidadãos. Após a conclusão, foi apresentado um ensaio baseado nas lições da teoria neurocomportamental contemporânea e nas reflexões de Cass Sunstein, na tentativa de superar a lacuna explicativa de Honneth quanto aos processos de patogenia social por uma perspectiva macro.