Democracia, canções e denúncias : análise das narrativas políticas e sociais entre 1994-2002 nas bandas Chico Science & Nação Zumbi, O Rappa e Planet Hemp

Dissertação de mestrado

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Resumo

As narrativas políticas e sociais contidas nas canções do rock brasileiro a partir de 1990 são objeto desta reflexão. As bandas selecionadas são Chico Science & Nação Zumbi, O Rappa, e Planet Hemp, pois, além de alcançar grande sucesso de público, são identificadas como “críticas”. O rock se torna um elemento incomodativo para análise em vista da singularidade de seu sentido: contestação, inconformismo, vontade de mudança. Crítico, político, contestador, alienado, reacionário ou mantenedor da ordem, esse símbolo de rebeldia marcou e marca a identidade de diversas gerações. Predominou na década de 1980 e é a trilha sonora da abertura e dos primeiros anos da Nova República. Uma vez que a análise das particularidades brasileiras e de seus processos históricos não se faz unicamente à luz de elementos objetivos, as canções se tornam documento histórico e de interpretação de um contexto. Aqui, busca-se analisar de que modo expressam relação com os acontecimentos, ações, procedimentos e práticas políticas voltadas para as (im)possibilidades da construção da democracia no Brasil no período entre 1990-2002. O que cantam as canções sobre esse período? Poderiam as canções contribuir para o desenvolvimento de uma sensibilidade democrática? Em que sentido? Quais seriam as possibilidades e limites? O método adotado é a Hermenêutica de Profundidade proposta por John B. Thompson, um processo interpretativo que combina análise interna (narrativas) e externa (sócio-histórica). A análise do contexto dá subsídios para a compreensão da produção documental, pois o que se decide registrar está relacionado ao contexto, refletindo e construindo a realidade. O fim da transição, marcada pela elaboração da Constituição (1988) e pelas eleições diretas (1989), prometia a efetivação de um Estado Democrático de Direito. As canções analisadas demostram capacidade crítica reflexiva acerca da violação dos direitos humanos por meio da ação e dos procedimentos racistas e classistas adotados pela polícia, por exemplo, mas não somente por ela. Podem ser pensadas à luz do contexto político e musical, como formas de contestação e de ação comunicativa, não só denunciando problemas sociais, como fazendo da arte uma forma de enfrentamento das desigualdades via resistência muscial. Por outro lado, também carregam em seus discursos aspectos desabonadores da construção de uma sensibilidade democrática, na medida em que apresentam discursos fatalistas, e também esteriotipados, minando disposições para agir em prol da mudança. Ademais, consideradas as condições de acesso à cultura, educação e lazer no Brasil, bem como a compreensão das mensagens, marcadas por relações de consumo e entretenimento, esse alcance formador pode ser reduzido. As análises apresentadas são reinterpretadas à luz do contexto e de referenciais teóricos.