Teses e Dissertações
Palavra-chave: Relação Público-Privado
A relação público-privado para a atenção de média complexidade em uma região de saúde
João Felipe Marques da Silva, Brígida Gimenez Carvalho
Data da defesa: 28/02/2018
O processo de municipalização dos serviços de saúde delegou ao ente municipal a
responsabilidade sobre o sistema de saúde de seu território, principalmente quanto à
coordenação da Atenção Básica. Ocorre que, para garantir a integralidade da
atenção à saúde, princípio e diretriz estruturante do SUS, este ente também assumiu
os serviços de Média Complexidade (MC), e por consequência, a relação com o
prestador privado complementar ao sistema, constituindo, portanto, a relação
público-privado deste nível de atenção. Neste contexto, especialmente em
municípios de pequeno porte (MPP), esta relação ocorre, sobretudo para a compra
de consultas especializadas, procedimentos hospitalares diagnósticos, clínicos e
cirúrgicos, por meio de relação contratual com o setor privado complementar, ainda
que o serviço esteja localizado em outro município ou sob gestão do Estado. A
relação entre os MPP e o serviço privado complementar se constrói em um cenário
de descentralização política-administrativa, sendo diretamente influenciada pelos
resultados da micro e macro organização das políticas de saúde; das matrizes
institucionais sobre o comportamento dos atores sociais e políticos; e pelas práticas
clientelistas vigentes nestes espaços. Nesta perspectiva, esta pesquisa propõe-se
compreender a relação entre gestores públicos e prestadores do sistema privado
complementar para a atenção de MC em uma região de saúde de municípios de
pequeno porte (MPP). Trata-se de um estudo de caso de natureza qualitativa,
realizada nos municípios da região de Ivaiporã (22ª Regional de Saúde do Paraná),
entre o período de dezembro de 2016 a fevereiro de 2017, utilizando entrevistas por
meio de roteiro semiestruturado. Os sujeitos da pesquisa foram os gestores
municipais, prestadores de serviços, membros gestores da regional de saúde,
consórcio intermunicipal de saúde, e apoiador do COSEMS. A análise dos
resultados se deu em duas etapas, a primeira por meio de análise documental, e na
segunda as entrevistas foram submetidas à técnica de análise do discurso proposta
por Martins e Bicudo (2003). A análise possibilitou a caracterização sócio
assistencial da região, e a construção de quatro categorias: demanda;
financiamento; contratos; gestão e planejamento de serviços. Os resultados apontam
que os fatores identificados nas categorias de análise referentes à demanda e ao
financiamento dos serviços de MC, permitem e favorecem a relação; enquanto as
características observadas nas categorias de contrato e gestão, as estabelecem e as
mantém. Estes fatores estão relacionados à organização das políticas de saúde e
das políticas institucionais. Destacam-se, entre outros aspectos, a influência da
formação médica na demanda de serviços de MC e o excesso de intervenções
diagnósticas, além de práticas de reservas de mercado para a assistência médica na
região. Quanto ao financiamento os municípios custeiam os serviços de MC com
recursos próprios, minimizando os investimentos na Atenção Básica. Observa-se,
também, que os contratos são executados em desencontro às normas operacionais
do sistema. A relação público-privado nesta região atravessa e afeta o processo de
regionalização desses municípios; é marcada por forte interdependência entre
gestores públicos e privados; assimetrias de poder; interesses ao acesso; e
benefícios à gestão municipal, a depender da tipificação de contrato entre o
município - exclusivo ou não exclusivo, com o prestador. Entre eles, vantagens,
práticas clientelistas, hierarquizadas, e de maximização de resultados de atores
envolvidos, são possibilitadas pela naturalização destas ações nos espaços em que
ocorrem. Conclui-se que a relação estabelecida fere o comando único do sistema,
possibilita práticas clientelistas, e é reforçada pelo incipiente processo de
planejamento e de medidas regulatórias pela gestão pública municipal e estadual;
além de apresentar a fragilidade do papel do Estado na região, bem como, das
instâncias colegiadas. Os resultados demonstram a necessidade de investir em
ações que favoreçam a governança e o processo de regionalização, a capacidade
regulatória de governos locais, e o controle social nesta região. Esta relação deve
ser aperfeiçoada por tecnologias de gestão, e modalidades de contratos que
possibilitem a integralidade das ações e a autonomia dos municípios perante os
prestadores.