O TRABALHO MULTIPROFISSIONAL NA ATENÇÃO PRIMÁRIA À SAÚDE E A GESTÃO MUNICIPAL
Larissa Cristina Caruzo, Brigida Gimenez Carvalho
Data da defesa: 03/07/2024
A produção sobre o trabalho multiprofissional na saúde teve início nas décadas de 1950 e 1960, e apontou a necessidade de uma remodelação dos processos de trabalho, a redefinição da finalidade e a busca por novas tecnologias de atuação. No Brasil, é possível reconhecer essa proposta nos ideais da Reforma Sanitária, na década de 1970, com vistas a um sistema de saúde universal e igualitário, que foi conquistado em 1988, com promulgação da Constituição Federal (CF) e a criação do Sistema Único de Saúde (SUS). A CF orientou também os moldes do atual federalismo brasileiro, com autonomia, principalmente política e administrativa, e em certa medida, financeira dos três entes: União, Estados e Municípios. A descentralização da gestão, também chamada de municipalização, incumbiu os municípios da organização e prestação de serviços de saúde local, mas manteve o poder indutor das políticas do ente federal. As gestões municipais ordenam o cuidado da Atenção Primária à Saúde (APS) por meio das equipes de Estratégia Saúde da Família (ESF), e em 2008 ganharam reforço das equipes dos Núcleos de Apoio a Saúde da Família (NASF), para aumento das estratégias de cuidado e trabalho colaborativo multiprofissional. O trabalho colaborativo pode ser executado dentro de um espectro contingencial com variações das atividades multiprofissionais. Este estudo buscou analisar os aspectos da gestão municipal que influenciam a atuação e limitações do trabalho multiprofissional na APS. Realizou-se um estudo qualitativo em nove municípios da macrorregião norte do Paraná. Os dados foram obtidos por meio de entrevistas, a partir de um roteiro semiestruturado, aos gestores municipais de saúde e coordenadores de APS, no período de julho a agosto de 2022, associado ao levantamento de dados secundários extraídos por meio do Cadastro Nacional de Estabelecimentos de Saúde (CNES) e do Sistema de Informações sobre Orçamentos Públicos em Saúde (SIOPS), sobre: equipes multiprofissionais, cadastro de profissionais na APS, tipo de vínculo, categorias profissionais e financiamento da APS. Os resultados caracterizaram administrativamente os municípios e os gestores, a atuação das equipes multiprofissionais e as limitações do trabalho multiprofissional. Predomínio de municípios de pequeno porte, e de municípios com equipes multiprofissionais cadastradas, modalidades de contratação mais robustas em municípios de grande porte, bem como maior quantitativo de profissionais associada a presença de profissionais da residência multiprofissional. Elevados gastos em APS nos municípios de pequeno porte, com ausência de equipes multiprofissionais. Evidenciou-se que os municípios de maior porte são os que apresentam maiores características do trabalho multiprofissional. Os altos gastos em APS, não se mostrou fator determinante para a multiprofissionalidade. A formação acadêmica dos atores, na área da saúde e com cursos de pós-graduação também contribui para a presença de organizações do trabalho na lógica multiprofissional. Os entrevistados apontam como fatores limitantes: a formação acadêmica, o baixo comprometimento dos profissionais com o trabalho, a dificuldade de compreensão do modelo matricial, por parte de todos os envolvidos (gestores, coordenadores profissionais da APS e população) e a visão hegemônica do cuidado. Observou-se que, esses atores podem não se reconhecer como parte essencial para concretização do trabalho multiprofissional, considerando que suas percepções sobre os impasses da multiprofissionalidade são direcionadas de forma mais frequente para outros indivíduos e aspectos, sem qualquer menção a possíveis fragilidades de gerência e pouco citaram estratégias de melhoria para efetivação do trabalho multiprofissional.
PROCESSO DE INTEGRAÇÃO ENSINO-SERVIÇO: A EDUCAÇÃO PERMANENTE EM SAÚDE COMO ESTRATÉGIA PARA O FORTALECIMENTO DA GESTÃO DO SUS
EDINALVA DE MOURA FERRAZ, Fernanda de Freitas Mendonça
Data da defesa: 04/04/2023
A gestão no/do Sistema Único de Saúde é uma atividade complexa, que requer das equipes gestoras a compreensão e um conjunto de habilidades e competências para superar os desafios vivenciados nessa área. E a integração entre os serviços de saúde e universidades pode ser uma importante estratégia para mitigar essa complexidade. A literatura demonstra que essas articulações são importantes para a qualidade da assistência, mas ainda é incipiente a realização de estudos que investiguem a integração ensino-serviço na perspectiva da gestão desse sistema, em particular, quando essa integração está ancorada nos pressupostos da Educação Permanente em Saúde. Dessa forma, o presente estudo teve o objetivo de analisar as repercussões de um processo de integração ensino-serviço por meio da Educação Permanente em Saúde, para o fortalecimento da gestão do Sistema Único de Saúde. Foi realizado em duas regionais de saúde, situadas na macrorregião norte do Estado do Paraná. Trata-se de um estudo qualitativo, de natureza compreensiva que se utilizou de duas técnicas complementares para obtenção e análise dos dados empíricos. No primeiro momento realizou-se observação participante durante as oficinas que aconteceram na 16ª Regional de Saúde, as quais contaram com uma média de 33 pessoas e que estruturaram esse processo de Educação Permanente em Saúde, nomeado de PROGESTÃO ocorrido entre o período de abril a dezembro de 2019. No segundo momento, foram realizadas entrevistas, no período de julho a dezembro de 2020, com pessoas que se destacaram em relação a participação, realização das tarefas de dispersão e troca de conhecimentos com os demais membros do grupo durante as oficinas. Devido a pandemia ocasionada pelo Coronavírus, essas entrevistas foram realizadas de maneira remota, pela própria autora da tese, com o apoio de um roteiro semiestruturado, o qual continha questões disparadoras para o diálogo, que abordavam sobre o processo desenvolvido, bem como suas repercussões para a prática da gestão em saúde. O referencial teórico metodológico utilizado para extração e análise dos dados oriundos da observação participante e das entrevistas foi a hermenêutica crítica, proposta por Paul Ricouer, onde se considerou, entre outros aspectos, a temporalidade do discurso, bem como sua subjetividade e sua representatividade. O resultado desta tese foi apresentado no modelo escandinavo, dividido em dois manuscritos. O primeiro manuscrito trata sobre o processo de Educação Permanente em Saúde desenvolvido. Escrito sobre o formato de relato de experiência, está estruturado em cinco seções: a primeira descreve o contexto em que a experiência foi desenvolvida, elucidando motivos, atores e a localidade em que ocorreu; a segunda apresenta a proposta de trabalho, a confecção das oficinas e os recursos metodológicos utilizados; a terceira relata o caminho percorrido na sua operacionalização; a quarta discute as características de interdisciplinaridade existentes no processo e a última apresenta algumas considerações. A proposta mostra-se como uma potente estratégia para promover o diálogo, qualificar e tornar reflexivo o trabalho no campo da gestão em saúde entre diferentes atores e instituições principalmente no contexto de crise sanitária e fiscal do Estado. O segundo manuscrito, analisou as repercussões desse processo de Educação Permanente em Saúde. Os resultados revelaram desafios e potencialidades do processo de Educação Permanente no âmbito da gestão em saúde, bem como repercussões para a atuação da equipe gestora em seu lócus de atuação. Apesar dos desafios revelados como a qualificação incipiente da equipe e dificuldade de institucionalização da Política Nacional de Educação Permanente, os profissionais reconheceram a importância da integração ensino-serviço na promoção de processos de formação que utilizam metodologias ativas e propiciam espaços coletivos de diálogo. O processo de EPS vivenciado durante o curso teve como repercussão uma maior integração entre as pessoas que participam de processos de gestão municipal, sentimento de pertença e de comprometimento à gestão, incorporação de processos de EPS no cotidiano da gestão, com destaque para o enfrentamento de problemas decorrentes da pandemia e no processo de definição do uso de recursos pela equipe gestora. É essencial promover processos de qualificação que considerem as necessidades dos sujeitos, contexto de atuação e singularidades dos profissionais que atuam na gestão do SUS. Esta tese demonstrou ainda que a complexidade da gestão vivenciada no contexto do SUS pode ser amenizada por meio de parcerias entre o mundo do ensino e o mundo do trabalho.