CONSÓRCIOS PÚBLICOS INTERMUNICIPAIS DE SAÚDE E CONTROLE EXTERNO: ANÁLISE DA ATUAÇÃO NO PARANÁ
ALESSANDRA DE OLIVEIRA LIPPERT, Fernanda de Freitas Mendonça
Data da defesa: 25/09/2025
A gestão do sistema de saúde descentralizado implica na transferência do poder decisório das esferas federal e estadual para os municípios. As Leis Orgânicas da Saúde apontam os Consórcios Públicos Intermunicipais de Saúde (CPIS) como estratégia frente aos limites da municipalização. A Lei Federal nº 11.107/2005 instituiu um novo regime jurídico aos consórcios públicos, configurando-os como instrumentos de cooperação federativa dotados de personalidade jurídica, capazes de contrair obrigações e exercer a gestão de serviços públicos de forma compartilhada. Esse novo paradigma institucional no espaço interfederativo impõe desafios significativos aos órgãos de controle externo, como o Ministério Público e os Tribunais de Contas, os quais precisam ajustar suas práticas fiscalizatórias à complexidade da ação consorciada. Esta pesquisa inova ao analisar as ações dos órgãos de fiscalização e controle externo e suas implicações na gestão dos arranjos consorciados. O estudo adotou uma abordagem qualitativa, de natureza exploratória, realizado entre 2022 e 2023. Foram utilizadas técnicas de análise documental e entrevistas com sete atores estratégicos: dois dirigentes e dois controladores internos de CPIS, dois promotores de justiça do Ministério Público do Paraná (MP-PR) e um técnico do Tribunal de Contas do Paraná (TCE-PR). O estudo ocorreu no estado do Paraná, que conta com 22 regiões de saúde nas quais atuam um ou mais CPIS. A análise documental foi realizada sobre 52 documentos (40 do MP-PR e 12 do TCE-PR), que incluiu a metodologia de análise preliminar conforme Cellard (2008), considerando autoria, autenticidade, natureza, conceitos-chave, contexto e lógica interna, em seguida, aplicou-se a análise de conteúdo segundo Bardin (2009). O conteúdo das entrevistas foi analisado seguindo a abordagem de análise de discurso proposta por Martins e Bicudo (2005), com identificação de unidades de significado e posterior articulação em categorias analíticas. A combinação das categorias documentais e discursivas permitiu construir um quadro comparativo, viabilizando o mapeamento da atuação dos órgãos de fiscalização e controle externo sobre os CPIS. A análise documental evidenciou que o TCE-PR concentrou sua atuação em temas relacionados à fiscalização e transparência, enquanto o MP-PR demonstrou ênfase na tutela de direitos individuais. Os resultados da análise combinada apontam que as ações dessas instituições vêm contribuindo para a padronização de procedimentos e o aprimoramento da gestão consorciada, porém, em alguns momentos essas ações ocorrem em um contexto de tensão entre autonomia local e exigência de accountability, em que a governança dos CPIS é atravessada por interações complexas entre gestores e os órgãos de controle. Verificou-se que essa atuação assume caráter bidimensional, ora marcado por um eixo punitivo, centrado na responsabilização e correção de irregularidades, ora por um eixo orientativo, voltado à indução de melhorias na gestão e à consolidação de práticas mais transparentes. Identificou-se também um certo confundimento institucional quanto ao papel e ao regime jurídico dos CPIS, o que contribui para explicar a origem e a persistência das tensões nas relações entre consórcios e órgãos de controle. Com base nessa análise, observa-se que a governança consorciada demanda articulação institucional, clareza normativa e práticas de gestão compartilhada, nas quais o diálogo, a corresponsabilidade e a transparência se tornam essenciais. Os referenciais do federalismo cooperativo e do neo-institucionalismo histórico permitiram compreender os condicionantes institucionais que moldam a ação dos CPIS e dos órgãos de controle, evidenciando padrões de continuidade e mudança, bem como os efeitos da atuação fiscalizatória na configuração das regras e na condução da política pública em saúde. Conclui-se que a tese alcançou seu objetivo ao demonstrar como a atuação dos órgãos de controle externo tem implicado diretamente na reorganização da gestão consorciada, influenciando seus aspectos operacionais, jurídicos e institucionais. A pesquisa reforça o papel estratégico dos CPIS como instrumentos de cooperação federativa e de fortalecimento da gestão regionalizada em saúde, ao mesmo tempo que aponta a necessidade de aprimoramento das práticas institucionais dos órgãos de controle e de sua maior aproximação com os consórcios, promovendo uma governança pública mais integrada, responsável e eficiente.
Hospitais em municípios de pequeno porte: sua inserção no SUS
Francisco Eugênio Alves de Souza, Elisabete de Fátima Polo de Almeida Nunes
Data da defesa: 02/02/2019
INTRODUÇÃO: Apesar da grande maioria dos municipios brasileiros serem de pequeno porte, poucos estudos tem se debruçado sobre o Sistema Único de Saúde –(SUS) e sobre o papel dos hospitias existentes nessas localidades, principamente estudos acerca do uso político destes, bem como sobre o poder simbólico que eles exercem. OBJETIVOS: Este estudo buscou refletir sobre o papel dos hospitais de pequeno porte (HPP) em municípios de pequeno porte (MPP) da região de Londrina, bem como, aprofundar a compreensão sobre a relação destes com as normativas do Sistema Único de Saúde (SUS) no que diz respeito aos programas de atendimento em redes de atenção à saúde (RAS), tais como a Rede de Urgência e Emergência (RUE) e da Rede Mãe Paranaense e também analisar os desafios dos gestores, os fatores que interferem na gestão e o poder simbólico dos hospitais em MPP. MÉTODOS: Estudo exploratório, de natureza compreensiva e interpretativa, desenvolvido por meio de métodos mistos, do tipo sequencial exploratório, utilizando-se de dados quantitativos e qualitativos. A coleta de dados e as entrevistas foram realizadas no período de março a dezembro de 2016, em 14 municípios de pequeno porte, que possuem hospitais, localizados na macrorregião norte do Paraná, na abrangência da 17ª Regional de Saúde. Os sujeitos foram os secretários de saúde e os diretores dos hospitais estudados, entrevistados utilizando roteiro semiestruturado. O foco teórico para a análise deste trabalho foi o conjunto de conceitos formulados para entender a sociedade moderna do sociólogo francês Pierre Bourdieu (1930- 2002), especialmente os conceitos de poder simbólico, campo, habitus e capital. RESULTADOS: Apresentados por meio de três manuscritos científicos. Os dados do primeiro revelaram extrema ociosidade da capacidade instalada, centros cirúrgicos inativos e baixíssima ocupação dos leitos hospitalares, não estando adequados à Política Nacional para Hospitais de Pequeno Porte (PNPHPP). O segundo manuscrito indicou que para os gestores entrevistados é fundamental a construção de um discurso pela manutenção desses hospitais ainda que faltem recursos para um atendimento integral, eficiente e que responda de forma resolutiva às demandas da população, pois o seu fechamento causaria um impacto negativo para a legitimação do gestor em exercício. Constatou-se que os HPP participam da RUE, embora não possuam condições de resolver muitos dos problemas dos pacientes atendidos, mas, como estão incluídos nas centrais reguladoras, os usuários podem ser encaminhados para hospitais de maior porte, conforme o desejo da população. Quanto a participarem da Rede Mãe Paranaense, verificou-se que a maioria dos HPP não tem condições de integração, tornando-se meros encaminhadores de gestantes para hospitais/maternidades de referência, embora o desejo dos gestores e da população local fosse que a atenção às parturientes ocorresse nos municípios de residência. O terceiro manuscrito, por fim, revelou que o capital político mobilizado pelo Poder Executivo local, representado por prefeitos e secretários de saúde, é determinante na seleção e escolha dos agentes que ocupam os cargos de direção e de outras funções nos hospitais. Logo, a autonomia da gestão técnica dos hospitais é limitada pelas condições estabelecidas mediante jogos de poder pertencentes ao campo político. TECENDO CONSIDERAÇÕES: Os HPP apresentaram desempenho abaixo do preconizado na assistência à saúde para a população à qual se destinam, bem como inserção incipiente na RAS. Os capitais simbólico e político investidos na ideia do Hospital ajudam a compreender por que, mesmo com baixa produtividade e custos elevados, os agentes políticos não abrem mão de custeá-los, ampliá-los ou mantê-los com os meios que dispõem.
Gestão de trabalho no SUS em municípios de pequeno porte
Stela Maris Lopes Santini, Elisabete de Fátima Polo de Almeida Nunes
Data da defesa: 14/09/2018
Este estudo teve o objetivo de compreender a gestão do trabalho no SUS em Municípios de Pequeno Porte (MPP) por meio da análise da organização da gestão do trabalho, dos instrumentos utilizados para provimento e fixação dos trabalhadores e sua interface com os modelos de administração/gestão pública. Faz parte da pesquisa denominada ―A gestão do trabalho no SUS em MPP do Paraná a partir do olhar da Equipe Gestora‖, Chamada Pública de Projetos 04/2012-Programa de Pesquisa para o Sistema Único de Saúde (PPSUS): Gestão Compartilhada em Saúde, Edição 2011. O estudo foi desenvolvido nos MPP da macrorregião norte do Estado do Paraná, utilizando abordagem quantitativa e qualitativa. A coleta de dados ocorreu em três movimentos, sendo o primeiro o levantamento da composição das Equipes Gestoras (EG) da saúde; o segundo foi realizado por meio de entrevista estruturada para caracterização do perfil dos Responsáveis pela Área de RH/GT, no período de novembro/2013 a outubro/2014; e o terceiro abordou aspectos sobre a gestão do trabalho e dos instrumentos de gestão utilizados. Os dados foram obtidos por meio de encontros com representantes das equipes gestoras (REG), durante o curso ―A gestão da força de trabalho no SUS em MPP‖, realizado no período de março a junho de 2015. Foi possível entrevistar 73 responsáveis pela área de RH/GT durante o segundo movimento. Destes, 50 (68,5%) encontravam-se atuando nas prefeituras e 23 (31,5%) nas secretarias municipais de saúde. Mesmo que os responsáveis pela área de RH/GT estivessem centralizados nas prefeituras, as EG da saúde também executavam ações nessa área. Dentre as potencialidades da gestão do trabalho em MPP, foram destacadas a pouca distância física entre as secretarias municipais e a autonomia para adesão a programas. As fragilidades foram relacionadas à falta de autonomia para: provimento das equipes, deliberação para pagamento de direitos trabalhistas e definição para alocação de servidores. Os Planos de Carreira, Cargos e Salários (PCCS) não eram específicos para a área da saúde e geralmente não vinculavam todos os seus servidores. Os MPP possuíam oferta de profissionais de saúde em seus próprios territórios. No entanto, determinados programas corriam o risco de ter seus incentivos financeiros suspensos por dificuldades de provimento de determinadas categorias profissionais. Algumas legislações foram destacadas como limitadoras para o provimento de pessoal, sendo elas a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) e a Emenda Constitucional (EC) n. 41/2003. As formas de seleção frequentemente aplicadas nos MPP foram os concursos públicos e os testes seletivos; as admissões por estatuto, emprego público, contratos, credenciamentos e cargos comissionados. A categoria médica foi considerada como a de maior dificuldade para provimento. Com a adesão ao Programa Mais Médicos (PMM) foi atendida a expectativa de provimento dessa categoria. A rotatividade dava-se mais frequentemente em situações de: vínculos não estáveis, não inserção a PCCS, exigência de cumprimento de carga horária contratual e baixos vencimentos. Desenvolviam-se ações que contribuíam para a fixação dos profissionais, dentre elas, a preferência por contratação de profissionais já residentes nos municípios e concessão de plantões ou de vínculos adicionais. Concluiu-se que a gestão do trabalho dos MPP ainda apresenta resquícios da Administração Pública Patrimonial (APP); as características da Administração 7 Pública Burocrática (APB) mostraram-se evidentes nos controles e nas formalidades dos processos de trabalho, e as influências da Administração Pública Gerencial (APG) estão sendo vivenciadas nos múltiplos vínculos, em outras formas de flexibização e na legislação.